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Tratando-se de ônus propter em que grava o próprio bem, a dívida condominial se transfere ao comprador, que tem de saldá-la para manter o equilíbrio econômico-financeiro da comunidade que passou a integrar.
Despesas de condomínio – Cobrança – Compromisso de compra e venda não registrado – Ciência inequívoca do condomínio – Ilegitimidade passiva do vendedor – Tendo o Condomínio ciência inequívoca da venda do imóvel e tratando-se de ônus propter rem que grava o próprio bem, a dívida condominial se transfere ao comprador, que tem de saldá-la para manter o equilíbrio econômico-financeiro da comunidade que passou a integrar. Sentença mantida. Recurso improvido (TJSP – 26ª Câm. de Direito Privado; Ap nº 992.09.085379-1-São Paulo-SP; Rel. Des. Felipe Ferreira; j. 23/9/2009; v.u.).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes Autos de Apelação n° 992.09.085379-1, da Comarca de São Paulo, em que é apelante C. E. V. M., sendo apelado R. R. S. A.
Acordam, em 26ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em proferir a seguinte decisão: “negaram provimento ao Recurso, v.u.”, de conformidade com o Voto do Relator, que integra este Acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores Felipe Ferreira (Presidente), Andreatta Rizzo e Vianna Cotrim.
São Paulo, 23 de setembro de 2009
Felipe Ferreira
Relator
RELATÓRIO
Trata-se de Recurso de Apelação contra r. sentença de fls. 198/204, que julgou extinto o Processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC, condenando o autor ao pagamento das custas, das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor atribuído à causa.
Pleiteia o apelante a reforma do julgado, alegando que não teve conhecimento da relação jurídica existente entre a ré e terceiros. Aduz que o nome do compromissário comprador foi inserido na relação de condôminos por ser representante do imóvel, mas nunca informou a que título.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os Autos a esta Corte de Justiça.
É o relatório.
VOTO
O Recurso não merece prosperar, pois, como declarado na sentença, efetivamente procede a alegação de ilegitimidade passiva ad causam deduzida na Contestação.
De fato, como bem observou o Magistrado sentenciante, “no documento juntado a fls. 70, relativo à relação dos condôminos presentes à Assembleia Geral Extraordinária do Condomínio, realizada em 5/10/2004, constou o nome do Sr. A. S. P. S., na condição de condômino e proprietário do apartamento nº … do condomínio autor. Assim também, na relação dos condôminos presentes à Assembleia Geral Extraordinária do Condomínio, realizada em 9/12/2005, constou o nome do Sr. A. S. P. S., na mesma condição supramencionada (fls. 83). Tais documentos demonstram que o condomínio autor sabia que a ré não tinha a posse do indigitado apartamento, ocupado por outra pessoa” (fls. 203).
Dessa forma, restou comprovado pela apelada que o imóvel foi vendido para A. S. P. S. e R. P. S. (fls. 172/183), sendo irrelevante o não registro do contrato particular de promessa de venda e compra, uma vez que o condomínio tinha ciência inequívoca dessa transação e da consequente substituição do condômino, tanto que do cadastro de condôminos consta o nome do comprador A., como bem constou da sentença.
Nesse sentido, o C. STJ (4ª T.; REsp n° 201.871; Rel. Min. Sálvio Figueiredo; j. 20/4/1999; DJU de 2/8/1999) entendeu que o legitimado a responder pela dívida é quem lhe deu causa, mesmo que o registro imobiliário ainda aponte para o nome do antecessor. Veja-se o julgado:
“Civil e Processual Civil. Condomínio. Despesas comuns. Legitimidade passiva. Promitente comprador. Possibilidade. Promessa de compra e venda. Registro. Desnecessidade. O promitente comprador é parte legítima para responder pelas despesas condominiais se a dívida se refere ao pedido posterior à celebração do contrato de promessa de compra e venda, ainda que não registrado, havendo legitimidade do promitente vendedor somente se o débito cobrado se referir à data anterior à do contrato.”
No mesmo sentido:
“Civil e Processual Civil. Condomínio. Cobrança de taxas condominiais. Legitimidade passiva do promitente comprador. Contrato não levado a registro. A palavra ‘condômino’, contida no caput do art. 12 da Lei n° 4591/1964 (quando diz que ‘cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio’), pode ser eventualmente interpretada como sendo outra pessoa que não o proprietário em nome de quem a unidade autônoma esteja registrada no livro imobiliário. A despeito de ainda não ter sido registrado o contrato de promessa de compra e venda, cabe ao promitente comprador de unidade autônoma as obrigações respeitantes aos encargos condominiais quando já tenha recebido as chaves e passado a ter, assim, a disponibilidade da posse, do uso e do gozo da coisa. Recurso não conhecido” (REsp nº 200.914-SP; Rel. Min. Cesar Asfor Rocha; publicado no DJU de 13/12/1999).
“Civil. Compromisso de compra e venda. Cotas condominiais. Cobrança. Titularidade do comprador do imóvel para figurar no pólo passivo da demanda. 1 – A cobrança de cotas condominiais deve recair sobre o comprador da unidade adquirida em condomínio, sendo irrelevante o fato de a escritura de compra e venda não estar inscrita no Cartório de Imóveis. Precedentes do STJ. 2 – Recurso conhecido e provido” (REsp nº 174.737-SP; Rel. Min. Waldemar Zveiter; DJU de 29/11/1999).
“Condomínio. Cobrança de despesas condominiais. Unidades compromissadas à venda. Circunstância não desconhecida pelo autor. Ação movida contra o promitente vendedor. Inadmissibilidade. Processo extinto. Aplicação do art. 267, inciso VI, do CPC. Tendo o administrador do condomínio pleno conhecimento de haver o condômino compromissado à venda unidades condominiais e reconhecendo a legitimidade da transação, passando até a emitir os recibos das despesas em nome dos compromissários compradores e dando-lhes quitação, vedado lhe é cobrar despesas condominiais aos promitentes vendedores, sendo irrelevante que em nome destes esteja a titularidade dominial das unidades” (RT nº 594/124).
“Condomínio. Despesas condominiais. Cobrança. Legitimidade passiva. Adquirente (ou compromissário comprador). Alienação da unidade condominial. Ciência ao condomínio. Ocorrência. Título aquisitivo não registrado. Irrelevância. Reconhecimento. As despesas condominiais têm caráter propter rem, direcionando-se a cobrança contra o promissário comprador, ainda que o compromisso de compra e venda não esteja registrado, mormente se o condomínio está ciente da transação. Ilegitimidade passiva reconhecida” (Ap sem Revisão nº 555.621-00/5; 1ª Câm.; Rel. Juiz Magno Araújo; j. 13/9/1999).
“Condomínio. Despesas condominiais. Cobrança. Legitimidade passiva. Compromisso de compra e venda não registrado. Ciência do condomínio. Ocorrência. Não reconhecimento. É certo que o condomínio pode optar, em face da natureza propter rem da obrigação, por cobrar as cotas do proprietário ou da pessoa que ocupa a unidade, contudo, se esta foi alienada e, durante muitos anos, o promissário comprador agiu como detentor da posse e expectador da propriedade e, ainda, constata-se que o promitente vendedor notificou o condomínio a respeito do negócio, caracterizada está a ilegitimidade passiva do proprietário que figura no registro imobiliário. Nega-se provimento ao Recurso” (Ap sem Revisão nº 593.241-00/9; 3ª Câm.; Rel. Juiz Aclibes Burgarelli; j. 30/1/2001).
“Condomínio. Despesas condominiais. Cobrança. Legitimidade passiva. Proprietário. Compromisso de compra e venda. Registro. Ausência. Ciência do condomínio. Ocorrência. Não reconhecimento. A Ação foi mal dirigida contra quem figurava como proprietário no registro imobiliário, mas que, em verdade, já havia alienado a unidade, de sorte que se impunha o reconhecimento da ilegitimidade passiva de parte (inciso VI do art. 267 do CPC), com a conseqüente extinção da Ação em relação ao apelante, arcando o autor com as despesas processuais por este despendidas e honorários advocatícios de seu Patrono, fixados em 15% sobre o valor atualizado da causa” (Ap sem Revisão nº 720.849-00/7; 2ª Câm.; Rel. Juiz Vianna Cotrim; j. 25/8/2003).
Doutra parte, trata-se de dívida que onera o próprio bem, dada sua natureza propter rem.
Sobre a obrigação propter rem, com a clareza e a acuidade intelectual que a caracterizam, preleciona o Prof. SILVIO RODRIGUES (Direito Civil, vol. 2, 5ª ed., Saraiva, 1975, p. 101/104) que:
“A obrigação propter rem é aquela em que o devedor, por ser titular de um direito sobre uma coisa, fica sujeito a uma determinada prestação, que, por conseguinte, não derivou da manifestação expressa ou tácita de sua vontade. O que o faz devedor é a circunstância de ser titular do direito real, e tanto isso é verdade que ele se libera da obrigação se renunciar a esse direito.
d) O condômino é obrigado a concorrer, na produção de sua parte, para as despesas de conservação ou divisão da coisa e suportar na mesma razão os ônus, a que estiver sujeita (CC, art. 624). A obrigação de reparar, consignada no artigo acima transcrito, não derivou da vontade do obrigado, que pode mesmo ser um impúbere, como ocorre na hipótese de ter o infante herdado fração ideal de um prédio, mas decorre de sua mera condição de comunheiro. Portanto, mais uma vez, nos encontramos na presença de uma obrigação propter rem.
Portanto, a obrigação propter rem é aquela que se caracteriza pela presença de 3 características básicas: 1 – Ela prende o titular de um direito real, seja ele quem for, em virtude de sua condição de proprietário ou possuidor; 2 – O devedor se livra da obrigação pelo abandono do direito real; 3 – A obrigação se transmite aos sucessores a título singular do devedor.”
Fonte: http://www.mestrejuridico.com.br/jurisprudencia/ex-proprietario-de-imovel-nao-responde-por-divida-do-condominio/